domingo, 30 de julho de 2017

Minas do Ouro (Frei Betto)

Autor famoso por retratar trechos emblemáticos da história brasileira em seus romances, especialmente o período da ditadura, desta vez Frei Betto destaca o período áureo da mineração. Esse é o segundo romance dele no gênero de ficção histórica, sendo precedido apenas por Um Homem chamado Jesus.
Inicialmente, totalmente dentro do contexto, o título da obra faz referência à Capitania de São Paulo e Minas do Ouro, uma das capitanias surgidas após a Guerra dos Emboabas, no ano de 1709. Contudo, a história aqui narrada remonta a um período bem mais precoce, de forma que o autor percorre por cerca de quinhentos anos da história brasileira, especialmente aqueles em que o ciclo do ouro constituiu-se na maior riqueza da nação, atraindo a cobiça dos mercados estrangeiros.
O foco da narrativa é um misterioso mapa que estava sob o poder da família Arienim. A partir dele, o leitor percorrerá pelas várias gerações dessa família, desde as primeiras bandeiras que desbravaram o interior do país em busca do ouro até a chegada de uma empresa mineradora de sucesso às minas de Morro Velho. Logo, embora outras regiões brasileiras contribuam para melhor compor o espaço na qual o enredo se constrói, o foco é o estado de Minas Gerais, especialmente as terras de cidades que mais tarde viriam a se tornar no que hoje conhecemos como Ouro Preto, Mariana, São João Del Rey, Sabará, etc..
A história da saga da família Arienim na busca pela realização da promessa dourada daquele mapa é narrada em terceira pessoa, através de apontamentos, sendo que cada um dá ênfase a um membro desta família aguerrida. Tudo começa no Vale do Tripuí, região do que mais tarde viria a se tornar o município mineiro de Mariana, onde as primeiras esperanças de encontrar ouro se realizaram: o ouro preto. Para a sociedade daquele tempo, os primeiros lampejos do metal justificavam o abandono de suas principais atividades laborais a fim de que se dedicassem integralmente à procura do metal que transformaria definitivamente suas sofridas vidas: “Logo a notícia do ouro do Tripuí ganhou asas, correu vozes, suscitou delírios. (...) A lavoura perdeu braços; a defesa, militares; as embarcações, tripulantes. Padres trocavam a batina pela bateia. (...) Todo cavalgavam na fantasia de desentranhar da terra o metal que produziria a alquimia de suas vidas.”
Frei Betto usa um linguajar bastante típico e brinda o leitor com uma verdadeira imersão na cultura mineira. A conexão da estória da família Arienim na história de Minas Gerais ocorre de forma perfeita, percorrendo episódios elementares que ressaltam a importância do estado mineiro no contexto brasileiro: as bandeiras, a exploração do ouro, os cultos religiosos (especialmente o Triunfo Eucarístico), a Inconfidência Mineira (o apontamento dedicado a Tiradentes é épico), a obra de Antônio Francisco Lisboa (o Aleijadinho), finalizando no desfecho em que o último Arienim finalmente descobre a ligação entre o fragmento de mapa que sua família tanto cultuava e o anel de diamante que ninguém menos do que Elizabeth Taylor portava durante um evento.
Ciente do desafio de que os romances históricos acabam por inevitavelmente retratar o ponto de vista histórico de seus autores, Frei Betto constrói uma paródia da história oficialmente consagrada. Trata-se de uma leitura própria dos fatos e acontecimentos, a partir da vivência e do contexto de seus personagens fictícios, algumas vezes sendo fiel à cronologia dos acontecidos, outras vezes fazendo uma releitura fantástica para narrar determinado fato com tons de sensacionalismo. Portanto, há quem diga que Minas do Ouro seja mais uma metaficção historiográfica do que um típico romance histórico, uma vez que conta uma visão alternativa, sob a perspectiva daqueles que não eram personagens cujos nomes foram consagrados pelos história convencional. Na dedicatória da obra, o autor homenageia os 300 anos de fundação de Ouro Preto, Mariana e Sabará. Porém, a escrita dessa obra homenageia os mineiros e principalmente aqueles que derramaram sangue e suor na busca do metal precioso que fez com que o Brasil conquistasse ainda mais o olhar de Portugal e do mundo, ainda que com interesses meramente exploratórios.

REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título:   Minas do Ouro
Autoria: Frei Betto
Editora: Rocco
Ano:      2011
Local:    Rio de Janeiro
Gênero: História | Épico

quinta-feira, 20 de julho de 2017

47 Ronins (John Allyn)

            Exaltando a tradição da cultura japonesa, John Allyn busca recontar em formato de prosa a incrível história que, para muitos, trata-se apenas de uma lenda. A edição traz em sua capa um cartaz do filme estrelado por Keanu Reeves e lançado em 2014, muito embora haja significativas diferenças entre a mídia literária e a mídia cinematográfica.
            No Japão feudal do século XVIII, mais precisamente por volta do ano 1701, a província de Ako vivia sob o comando do respeitado mestre samurai Lorde Asano Naganori. O país vivia submetido à Lei de Preservação da Vida, decretada pelo Xógun – líder supremo de todo o Japão, em que todo o ser vivente, seja humano ou animal, deveria ter preservado seu sagrado direito à vida e à incolumidade de sua existência. Incitado pelo alto funcionário do xógun, Kira Yoshihisa, Lorde Asano comete-lhe uma agressão tida como imperdoável naquela sociedade fortemente marcada pela disciplina e obediência. Consequentemente, o daimio é condenado a praticar o seppuku, ou seja, ferir-se fatalmente, como sinal de honra e expiação. Com sua morte, quarenta e sete guerreiros são rebaixados à condição de ronins, o que significava que agora eram samurais sem mestre. Em uma sociedade cuja referência das lideranças era extremamente importante, ser um ronin era o mesmo que pertencer a uma categoria desprezada na pirâmide social.
            A lealdade e honra à memória do falecido mestre não deixariam que aqueles ex-samurais aceitassem passivamente a condição que um golpe injusto do destino lhes submetera. Com isso, liderados por Oishi, vingar seu antigo mestre tornar-se-ia o propósito de vida que permitiria àqueles ronins serem coerentes com a memória de seus ensinamentos. Nesse contexto, desvela-se o que seria o maior destaque da cultura japonesa a que o autor se propõe ao recontar a história dos ronins: o código de honra samurai (bushidô), no qual valores como a justiça, lealdade, verdade e fidelidade aos princípios constituir-se-iam no principal meio de um ronin alcançar algum orgulho em suas atitudes. Destaca-se pois a grande mensagem que a lenda e a obra buscam transmitir, segundo a qual a fidelidade aos princípios deve ser algo religiosamente protegido, ainda que isso signifique perder a própria vida.
            A narrativa de John Allyn, embora bastante informativa, por vezes se perde na extensão reflexiva sobre as intenções de seus personagens. Mesmo assim, a leitura flui com bastante rapidez tornando o livro uma obra agradável e interessante. Existem diversos personagens secundários que demonstram a importância dos laços familiares para o personagem principal. Talvez uma crítica negativa seja na apresentação gráfica que a edição trouxe em sua capa e contracapa ao exibir um pôster do filme. O leitor que se dedicar a buscar saber qual dos personagens do livro seria aquele estrelado por Keanu Reeves pode se decepcionar. O filme, cuja fantasia alimenta ainda mais a crença de que a história dos ronins não passa de uma lenda, serve muito mais aos anseios mercadológicos da indústria do cinema do que à exibição de um recorte da rica história japonesa. Dessa forma, a obra de John Allyn e a produção cinematográfica são duas coisas distintas e independentes entre si, fazendo com que a referência que o livro faz ao filme sirva puramente a uma jogada de marqueting. Enfim, a lenda dos 47 Ronins exalta a inconformidade diante das condições que a vida impõe, fazendo com que a honra seja buscada dentro de si mesmo e não frente àquilo que a sociedade considera como memorável.

REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título:      47 Ronins, Os
Subtítulo: a clássica história de lealdade, coragem e vingança
Autoria:    John Allyn
Editora:    Novo Século Editora
Ano:         2013
Local:       Barueri
Gênero:    Drama

Confira o trailer do filme lançado pela Universal Pictures em 2014:


segunda-feira, 10 de julho de 2017

Eu, Alex Cross (James Patterson)

Alex Cross é um dos personagens que rendeu ao seu ator milhares de livros vendidos pelo mundo todo e as primeiras posições no ranking de mais vendidos dos Estados Unidos. Este livro é parte integrante de uma série que, assim como Private e O Clube das Mulheres contra o Crime fazem com que James Patterson seja um dos mais respeitados autores de romance policial de todos os tempos. Seria ele um substituto à altura dos já aclamados Arthur Conan Doyle e Agatha Christie?
Alex Cross estava comemorando seu aniversário quando recebe uma notícia avassaladora: sua sobrinha, Caroline Cross, fora assassinada de uma forma bárbara e seu corpo fora fragmentado em um triturador de madeira. Mesmo abatido, Alex tomaria o caso para si e receberia o auxílio do amigo detetive Ned Mahoney. Não bastasse o impacto dessa notícia, Alex ainda lidava com outro episódio familiar para aguçar ainda mais sua crise: sua avó, Nana, estava seriamente doente e, por mais que o trabalho requeresse integral dedicação do detetive, ele não abriria mão de cuidar daquela pessoa amada que para ele significava uma parte de si mesmo.
As investigações levam os detetives à descoberta de que Caroline estava envolvida com uma casa de prostituição luxuosa. Blacksmith Farms era um clube privativo para figurões, localizado na Virgínia. A suspeita da ligação do crime com o clube estava no fato de que ela não fora a única vítima a perder a vida no local. Um homem de codinome Zeus era o maior suspeito, mas não havia qualquer pista sobre sua verdadeira identidade e a motivação dos crimes. Por outro lado, o serviço secreto da Casa Branca, sob a supervisão de Dan Cormorant, também se envolvera com o caso. A própria presidente dos Estados Unidos, através do chefe de gabinete, Gabriel Reese, fizera de tudo para que o caso saísse do Departamento de Polícia e passasse para a tutela do FBI, porém as circunstâncias não justificavam tamanha precaução.
Alex Cross chegara a interrogar um funcionário de uma rede televisiva e suspeitava também do senador Marshall Yarrow. Por outro lado, Dan Cormorant, acreditava cada vez mais que Zeus pudesse ser ninguém menos do que Remy Williams, ex-agente do Serviço Secreto. Em meio a esse ínterim, a certeza de que membros do governo pudessem estar ligados aos crimes crescia e as ações do detetive Cross teriam que ser cuidadosamente planejadas. Não somente sua carreira poderia estar em jogo, mas também a integridade de sua família estava em risco, já que sua residência parecia estar sob constante vigilância. No entanto, a preocupação com a saúde debilitada de sua avó talvez seja o fator que mais abalasse o psicológico de Alex. Cada telefonema era atendido com a apreensão de quem não está preparado, mas sabe que uma notícia ruim poderia chegar a qualquer momento.
O estilo narrativo de Patterson é bastante leve, delimitado por capítulos curtos cujos acontecimentos são bem divididos. Contudo, há uma gama de personagens e fatos que exigem bastante atenção, principalmente porque a conspiração é a alma de um bom romance policial. A conciliação do drama familiar vivido por Alex Cross e a maestria no desempenho de seu trabalho demonstra um lado mais humano e o emocional frágil do protagonista da série. Interessante observar que os oponentes de Cross não exploram tal fragilidade, demostrando que o detetive não costuma misturar sua vida pessoal com a profissional. Por outro lado, podemos perguntar se o assassinato da sobrinha de Cross não tinha como objetivo atingi-lo em cheio, ainda que ela não tivesse contato com Caroline há anos. Qual seria a real intenção dos autores do crime?
James Patterson pecou na finalização simplória de outro de seus romances bombásticos: Zoo. Neste, talvez o alto cargo ocupado pelos envolvidos no esquema do assassinato e a gravidade de sua ligação com os membros da Casa Branca fosse o melhor que ele conseguiu para tornar a história impactante e surpreendente. Tamanha expectativa criada durante a narrativa culminam em um Zeus apagado durante toda a trama, de que não se tem muitas informações, mas que, na verdade, é o “cara” do romance. A trama é boa, mas nada que faça ser pomposamente aplaudida de pé...

REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título:   Eu, Alex Cross
Autoria: James Patterson
Editora: Arqueiro
Ano:      2011
Local:    São Paulo
Série:    Alex Cross
Gênero: Drama | Policial | Suspense