sábado, 29 de novembro de 2014

Treze contos diabólicos e um angélico (Frei Betto)



            Na vasta bibliografia de Frei Betto esse é um livro de contos. Como o próprio título já deixa claro, o número dos contos é especificamente definido, assim como o escopo dos temas tratados em cada um.
            O número 13 para os contos diabólicos não é arbitrário. Refere-se àquilo que já é senso comum, de que tal número está imbuído de azar. Talvez caiba a pergunta: e por que não o 7 para os contos angélicos, já que o senso comum consagrou esse número como o algarismo da sorte? Creio que o único conto angélico dessa coletânea seja como uma espécie de refrigério após tantas narrativas sórdidas, ressaltando desse modo o caráter essencialmente trágico que permeia o contexto da vida humana. Muito embora o desfecho da história narrada não seja tão feliz, não se deve confundir felicidade com bem-aventurança.
            Os contos de Frei Betto trazem situações do cotidiano cuja moral muitas vezes atenta contra as boas virtudes. Não há figuras míticas ou lendárias como criaturas horrendas e malévolas munidas de garfos, fogo e escudos a aterrorizar os mortais, exalando um cheiro pútrido e sulfuroso, habitantes de locais sórdidos e obscuros cujo calor ardente ultrapassa os limites suportáveis pelo corpo humano. O que há são referências às insígnias do mal, que ora pode se manifestar como uma vantagem aparentemente insignificante, ora como uma pessoa extremamente atraente e sedutora. Imagens à parte, uma característica presente em todos os contos é a referência a uma criatura maléfica, que circunda pessoas e situações à semelhança de um espectro invisível, porém extremamente atuante. Para identificá-la, vale destacar a variedade de nomes para referir-se ao mesmo ser: Cão, Beiçudo, Bode-preto, Tinhoso, Cujo, etc.. Todos eles igualmente extraídos da cultura popular.
Cada conto trabalha um tema de desvirtude por meio de uma história inteiramente plausível, atual e corriqueira. Desse modo são retratadas as diversas faces com que o mal pode se revestir: uma mulher bonita e bem vestida, traduz a vaidade extrema, bem como a tentação ao adultério; uma soma de dinheiro considerável instiga ao crime de peculato; um procedimento administrativo burocrático abrange diretamente a ineficiência das políticas públicas; o fascínio quase surreal da televisão indica a prisão que as algemas da mídia pode ocasionar.
Outro ponto de destaque nessa obra são os traços regionalistas da cidade natal do autor. Cenários de Belo Horizonte como a Avenida Afonso Pena, Parque Municipal, Rua Guaicurus e o Minas Tênis Clube estão presentes como espaço em alguns contos, por exemplo, em Viagem do inconsciente à loucura de uma noite de núpcias.
Em síntese, esse livro é absolutamente reflexivo no que diz respeito ao cunho moral, só que de uma forma que se desapega da tendência moralizante que os ensinamentos geralmente adotam. 

REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título:        Treze contos diabólicos e um angélico
Autoria:      Frei Betto
Editora:      Editora Planeta do Brasil
Ano:           2005
Local:         São Paulo
Edição:       1ª
Gênero:      Política

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

The Walking Dead: desejos carnais (v.4) (Robert Kirkman)


Na sequencia de toda a desorganização provocada pelo repentino apocalipse zumbi, os sobreviventes tem que lidar com outro fator agravante: os humores exaltados devido à carga de estresse a que estão submetidos. Não há explicações e os suprimentos para uma vida minimamente digna estão escasseando cada vez mais. Para além de tudo isso, cada desconhecido passa a ser uma nova ameaça, já que os últimos eventos provaram que nunca se sabe do que são capazes. A morte reinava em Atlanta e imediações, deixando aos poucos sobreviventes o desafio de se manterem salvos. Mesmo que por pouco tempo...
Por um lugar descampado, uma mulher negra caminha tranquilamente com dois errantes mutilados a carregarem sua bagagem. Era Michone, extremamente habilidosa com sua espada ninja. Quando Otis passa por ela em uma carroça, ela o segue e salva-lhe a vida, às portas da prisão. Enquanto isso, na prisão, Dexter e seus aliados permanecem intransigentes em sua ordem de retirada para o grupo de Rick. Contudo, uma confusão terminaria na eliminação dos presidiários, restando apenas Axel. Os conflitos levavam à triste constatação de que todos chegaram a um ponto em que “Ou você mata ou você morre”.
Andrea reúne o grupo para anunciar a boa notícia de que encontrara centenas de peças de roupas, melhorando um pouco o estado deplorável em que suas vestes se encontravam. Posteriormente, durante uma ação para explorar novos ambientes da prisão, Rick encontra uma biblioteca e o gerador de energia do complexo em outra sala. Contudo, Allen se distrai e é mordido na perna por um errante. Numa tentativa desesperada para salvar-lhe a vida, Rick amputa a perna de Allen friamente. Em outro plano, Michone aborda Tyreese em uma sala e tem relações sexuais com ele, mas Carol os vê pela grade da porta. Algum tempo depois, Andrea pega Michone conversando sozinha em sua cela. Decepcionada com a traição Carol tenta suicídio, cortando os próprios pulsos. Entristecido, Rick vai avisar Tyreese e o flagra abraçando Michone. Os dois iniciam uma discussão e travam uma luta violenta, ferindo-se gravemente. O conflito só termina quando Andrea chega e comunica a morte de Allen. Depois, Rick desmaia. Ao acordar, tem uma longa conversa com Hershel, onde é advertido de que lhe faria bem que deixasse de ser o líder, pois tal tarefa o estava sobrecarregando muito. Rick vai para a área externa da prisão e tem uma longa conversa com o grupo.
Conforme relatado, no quarto volume da série em quadrinhos Os Mortos-vivos a personalidade dos personagens é evidenciada de forma muito clara. O autor consegue demonstrar, de forma gradativa, o efeito emocional que toda a carga negativa produziu no grupo liderado por Rick Grimes e que vinha se acumulando desde o encontro no acampamento montado na floresta até o encontro da prisão. Se todos estavam, de certa forma, “contaminados” e morreriam de qualquer forma, que sentido havia em se manterem vivos e reféns dos perigos de se tornarem comida de zumbi a qualquer momento? Essa é a grande questão ético-filosófica trabalhada pelo autor e talvez o que faça da aclamada série The Walking Dead uma verdadeira poesia da vida até as últimas consequências.


REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título:         Walking Dead, The
Subtítulo:    desejos carnais (v.4)
Autoria:       Robert Kirkman / Charlie Adlard
Editora:       HQM Editora
Ano:            2006
Local:          São Paulo
Edição:        1ª
Série:          Mortos-vivos, Os - Volume IV
Gênero:       Zumbi | Suspense | História em quadrinhos

Confira o trailer da 3ª temporada da adaptação para o cinema lançada em 2013:

 

domingo, 9 de novembro de 2014

Luciana Saudade (Carlos Heitor Cony)



            Os conflitos da complexa e explosiva fase da adolescência vêm à tona nesse pequeno romance de Carlos Heitor Cony. Uma temática que retrata bem o lado sonhador dos jovens, bem como aquilo de que são capazes para perseguirem seus sonhos.
            Luciana Torres é uma adolescente de 15 anos, comum a todas as outras em sua rotina de estudos, diversão e convívio familiar. Em sua escola fora anunciada a realização de um concurso de música, no qual os estudantes poderiam demonstrar seus talentos. Como amava cantar, Luciana logo se empolgou e foi apoiada por sua super-amiga Márcia. Era uma oportunidade valiosa para ser vista com outros olhos pelos alunos de sua escola, ainda mais porque o vencedor teria a oportunidade de se apresentar no Festival Internacional de Música Jovem, desta vez, no Maracanãzinho. Contudo, Luciana sentia-se ameaçada pelo prestígio que outra aluna tinha no colégio. Beth Alencastro era bonita, afinada e rica, de forma que atraia mais os olhares, principalmente dos garotos. Mesmo assim, Luciana não perderia a oportunidade de desbaratá-la e se consagrar como a grande campeã.
            A música escolhida por Luciana foi Felicidade, de Lupicínio Rodrigues. Porém, às vésperas da apresentação, a garota fora acometida por uma dor de garganta, ameaçando que tudo fosse arruinado. E no grande dia, o resultado não podia ter sido pior: Luciana desafinara de tal forma que o fã-clube de Beth se divertiu com as vaias. O sonho de uma carreira brilhante acabava de ser humilhado e Luciana sofria a primeira grande derrota de sua vida. Nem mesmo o consolo de Márcia e do amigo Raul aliviava tamanha dor.
            Os dias se passavam e, certa vez, Luciana encontrou um senhor muito pobre e sua filha em uma praça, a entoar alguns acordes no violão. O velho Inácio encantava Luciana de tal forma que ela voltou várias vezes para conversar com ele, mesmo sob severas recomendações de sua mãe, para que não falasse com estranhos. O velho cantava uma música de sua própria autoria chamada Saudade, que para Luciana era uma das mais belas que já ouvira.
            O Festival Intercolegial de Música Jovem estava próximo e trazia a novidade de que, além dos representantes de cada colégio, as inscrições seriam abertas aos demais interessados. Era uma nova chance para Luciana e ela queria encantar o público com a música do velho Inácio, tendo-o como companheiro no palco. Embora sua vontade fosse capaz de mudar a vida de Inácio e sua filha para sempre, caso vencesse o concurso, Luciana teria de contornar a proibição de sua mãe para participar do festival. Era uma oportunidade que poderia consagrar o sonho solidário de Luciana ou amargá-lo com outra derrota ainda mais fracassada.
            A obra de Cony é uma grande inspiração para a juventude desacreditada dos tempos atuais. A protagonista traduz a imagem do jovem brasileiro: pessoa comum com sonhos grandiosos. O diferencial é a atitude de Luciana, que a faz ir em busca de sua meta, não importando os esforços que teria de empregar e menos ainda as forças contrárias. Isso faz de Luciana Saudade uma leitura altamente recomendável para aqueles que estão no início do eterno processo de tomarem suas vidas nas próprias mãos.  
 
REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título:         Luciana Saudade
Autoria:       Carlos Heitor Cony
Editora:       Ediouro
Ano:            1998
Local:          Rio de Janeiro
Edição:        17ª
Gênero:       Drama | Motivação