Escrita em 1957, a obra O Estrangeiro encerra um enredo de narrativa seca e extremamente
objetiva. É a construção de uma história cujo desenvolvimento expressa uma das
ideias centrais do pensamento camusiano: o absurdo.
Mersault é o jovem protagonista do
romance que, logo no início é surpreendido pela notícia da morte de sua mãe. Ao
se preparar para a viagem rumo ao enterro, Mersault já demonstra as atitudes
que o caracterizam do início ao fim da história: a de uma pessoa fria, sem
expressão, pouco sentimental, para quem haja o que houver, tanto o tudo quanto
o nada nenhuma diferença faz. Suas atitudes são sempre as mesmas e a forma de
encarar a vida é completamente impassível, imparcial e indiferente. Tal
comportamento é logo percebido pelo diretor e pelos companheiros da casa de
repouso em que sua mãe vivia. Para ele tudo soava como fatos pertencentes a uma
realidade óbvia, de forma que não se deixava abalar por nada.
De volta para casa, Mersault
reassume a mórbida rotina de trabalho. Nada parecia mudar de tom, nem mesmo os
incansáveis esbravejamentos de seu vizinho Salamano, que vivia só, na companhia
de um cão. Até mesmo os encontros com sua namorada Marie, soavam a Mersault
como acontecimentos bastante casuais. Em sua vida nada parecia ser diferente, a
não ser pelo fato que transformaria seu destino.
Mersault tinha um amigo chamado
Raymond que, havia algum tempo, vinha tendo conflitos com um grupo de árabes,
fazendo-o sentir-se perseguido e provocado. O estopim dos desentendimentos se
dera em um passeio pela praia. Mersault, Raymond e Marie vinham caminhando
quando um dos árabes se aproxima e, numa atitude mal calculada, Mersault o
assassina friamente com cinco tiros. Não havia motivo algum de sua parte que
justificasse tal crime mas, ao se sentir acuado diante da exibição que o árabe
fazia com uma faca, o instinto de sobrevivência falara mais alto. Era o início
de um fim, mas para Mersault, até mesmo o crime que cometera era algo
indiferente.
A narrativa dos acontecimentos
posteriores toca em pontos elementares, principalmente quando o delegado incita
Mersault ao arrependimento e culpa ao mostrar-lhe um crucifixo durante seu
julgamento, em que a ausência de emoção surpreende até mesmo o advogado do réu.
O procurador recorre a tal comportamento a fim de evidenciar a frieza de
Mersault, trazendo à tona também sua falta de comoção diante da morte da mãe,
testemunhada pelos internos do asilo. Diante de tal quadro, no qual Mersault se
permitira ser levianamente maculado sem expressar qualquer reação que seja, ele
é condenado à guilhotina em praça pública.
Como foi sucintamente demonstrado
aqui, a atitude indiferente do protagonista frente às fatalidades que lhe
afetam é a maior demonstração da ideia de absurdo do pensamento de seu autor
nesse romance. Nem mesmo o diálogo de Mersault com um clérigo que o visitara na
prisão, é suficiente para fazer-lhe refletir em suas fontes de significado para
a vida. Tal inércia evidencia um importante tópico do pensamento
existencialista: o homem que se depara e se angustia diante da própria
liberdade, mas de uma forma que essa não faz diferença em seus horizontes de
significado. Mersault é um homem livre que se destrói sendo vítima de uma briga
que não era sua. Desta forma, Albert Camus delineia alguns traços para reflexão
que os conceitos de absurdo e liberdade representam em sua filosofia.
CAMUS, Albert. O Estrangeiro. Rio de Janeiro: Record,
2007. 28ª ed.. 126 pgs.
Assista abaixo a adaptação para o cinema lançada em 1967
e dirigida por Luchino Visconti:
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