sábado, 27 de outubro de 2012

Água para Elefantes (Sara Gruen)

            A vida circense sempre é envolta por um clima de alegria explosiva ao chegar e um certo vazio silencioso ao partir. Para os que fazem do espetáculo sua fonte de subsistência e renda, nada tão necessário como aprender a lidar com os sentimentos conflituosos que a vida nômade de chegadas e partidas pode ocasionar. Tal aprendizado foi apenas uma das grandes imposições que o revés de uma perda súbita depositou sobre os ombros do protagonista dessa história.
          Jacob Jankowski é mais um interno de um asilo pacato. Deprimido e aborrecido pela vida enfadonha que vivia, Jacob revive lembranças dolorosas mas também felizes ao presenciar a chegada de um circo que montara a lona em frente ao asilo. Era chegado o momento de revelar um segredo guardado há pelo menos 70 anos, de suas mais marcantes experiências em 1931.
        Jacob era um estudante de medicina veterinária na conceituada Universidade de Cornell, quando subitamente recebeu a notícia da morte dos pais em um acidente automobilístico, enquanto prestava os exames finais. Arrasado emocionalmente pela tragédia e financeiramente pela hipoteca da casa, abandonara os estudos. Durante uma caminhada sem rumo, embarcou clandestinamente no Esquadrão Voador do Circo Irmãos Benzini, o Maior Espetáculo da Terra. Desastrosamente, caíra nas mãos de Blackie e Earl, chefes da segurança, que logo conduziram Jacob à presença de Tio Al, o dono do Circo Irmãos Benzini. Tio Al era um homem rude, grosso, arrogante e desonesto, capaz de mandar lançar os funcionários para fora do trem em movimento caso se tornassem desnecessários ou lhe desagradassem. Alimentava uma grande rixa e espírito de competição com o Circo Irmãos Ringling e, como carecia de um veterinário para o trato dos animais, decidira dar a Jacob uma chance.
            Os integrantes do esquadrão dividiam-se em três categorias de funcionários: trabalhadores, artistas e chefes. Admitido na primeira, Jacob teria como desafio inicial, tratar de Silver Star, um cavalo doente e valioso para um dos espetáculos. Nesse contexto, conhece Marlena, que fazia uma apresentação com os cavalos, e August, chefe do setor de animais. Era um casal de artistas famosos e muito afeiçoados a Tio Al. Marlena tinha uma personalidade carinhosa, dedicada e submissa, enquanto August era alguém imprevisível: ora tranquilo e amável, ora extremamente grosso e agressivo.
            Em sua estada no Esquadrão Voador, Jacob fizera amizade com Walter, um anão artista que tinha uma cadela de estimação chamada Quennie, e Camel, um velho que teve as pernas paralisadas após ingerir gengibirra misturada com pinga.  No entanto, foi com um mamífero que Jacob se encantou e aprenderia uma das mais belas lições de lealdade. Rosie era uma elefanta que Tio Al comprara na esperança de salvar o circo da ruína, num momento em que o empreendimento também sofria as consequências da Grande Depressão Americana. Porém, fora tida como burra e demente, pois nada entendia que não fosse dito em polonês, forçando seus domadores a aprenderem os comandos nessa língua. Por um tempo, ela foi a atração principal com Marlena e August. Porém, os maus-tratos de August a Rosie suscitaram a ira de Jacob. A isso se somava também sua paixão por Marlena, que se sentia profundamente atingida pelos ataques de ira do marido. Tal conflito ocasionaria uma crise nunca antes vista no Irmãos Benzini, culminando num dos maiores desastres circenses da história.
            Sara Gruen se inspirou em livros do fotógrafo peregrino de espetáculos circenses, Edward J. Kelty, na escrita de sua história. Desta forma, com suas leituras e estudos sobre o tema, a autora mescla fatos reais em sua ficção, como a mulher de 400 kg, o gerente de um circo assassinado e um surto de paralisia causado pela gengibirra na Jamaica. O enredo transmite de forma bastante clara que os bastidores das alegres apresentações circenses escondem angústias que os espetáculos no picadeiro não demonstram, como as condições desumanas dos trabalhadores e os maus-tratos aos animais. Longe de focalizar de modo enfadonho e piegas o romance entre Jacob e Marlena, o enredo é marcado pelo ar dramático: uma certa nostalgia feliz revivida pelo idoso Jacob, mais marcada pela dor do que pela alegria, mas mesmo assim agradecida. A obra foi adaptada para o cinema com diferenças substanciais, como a ausência de alguns personagens, e certas modificações no enredo. Mesmo assim, na literatura ou nas telas, Água para Elefantes traz uma história verdadeiramente emocionante e capaz de encantar profundamente.

GRUEN, Sara. Água para Elefantes. Rio de Janeiro: Sextante, 2007. 336 pgs.

Confira o trailer da adaptação para o cinema lançada em 2011: 

 

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