sábado, 8 de setembro de 2012

A Obra do Artista: uma visão holística do universo (Frei Betto)

a obra do artista          Frei Betto é frade dominicano e escritor. Nascido em Belo Horizonte em 1944, estudou jornalismo, antropologia, filosofia e teologia, e lecionou física, química e biologia. Recebeu vários prêmios, dentre os quais: Jabuti (1983), principal prêmio literário do Brasil, por seu livro de memórias Batismo de Sangue; Juca Pato (1986), eleito pelos escritores brasileiros filiados à União Brasileira de Escritores como o Intelectual do Ano; prêmio da Fundação Bruno Kreisky, Viena, por seu trabalho em prol dos direitos humanos. Foi ministro do governo Lula e assessor da Pastoral Operária e de movimentos populares. A Obra do Artista foi o seu 30º livro, fruto de cinco anos de pesquisa.
          Embasado pelas descobertas da Cosmologia, Física Quântica e Biologia, Frei Betto busca sintetizar a complexidade do Universo em algumas páginas. Para isso analisa importantes teorias científicas, confrontando-as com a modernidade em crise.
          Embora impregnado de credibilidade, o solo científico é acidentado por incertezas. Ao longo da história, as teorias que atacaram a visão iconoclasta da Igreja (não só a Católica como também os protestantes Calvino e Lutero) provocaram fortes revoluções ideológicas. Assim foi com a Teoria Heliocêntrica de Copérnico, principalmente pela obra De Revolutionibus, como também com Galileu e Einstein. Deste último, a Teoria da Relatividade, pela qual o movimento, do ponto de vista da experiência possível, aparece sempre como o movimento de um objeto em relação a outro (por exemplo, um automóvel em relação ao solo, ou a Terra em relação ao sol), representou um grande avanço na física quântica. Dessa forma, além das grandezas já existentes (altura, comprimento e largura) é necessário também considerar a grandeza tempo. Ao contrário de Isaac Newton, para o qual a gravidade é uma força que atua entre corpos diferentes, para Einstein ela é o efeito da massa na geometria do espaço. No entanto, a questão sobre se o Universo é hiperbólico, aberto e infinito, ou esférico, fechado e finito, ou mesmo plano, ainda é uma incógnita para a ciência. Além do mais, diferente do que Einstein pensava, o Universo é dinâmico e está em constante expansão.
          Pela Física Quântica, toda e qualquer espécie de matéria é feita de partículas elementares. Ela é constituída de moléculas, que são feitas de átomos, que são feitos de prótons, nêutrons e elétrons, que são feitos de quarks e neutrinos. Assim, a Teoria Quântica permite constatar a unidade de todas as coisas: o todo nas partes e as partes agregadas no todo. A mesma energia vital presente no ser humano está nos outros seres animais, vegetais e minerais: "os seres humanos são tão naturais quanto uma abóbora ou uma estrela" (p. 37). Fragmentos do universo estão presentes em cada ser e estes são animados por um mesmo Espírito. No entanto, uma grande dificuldade se interpõe no estudo das partículas, pelo desafio de conceber espaço e tempo no continuum quadridimensional. As leis da natureza na dimensão macroscópica não se aplicam à dimensão microscópica. Na Física Quântica, a natureza é dual: um elétron pode se comportar ora como partícula, ora como onda. Além do mais, a concepção do observador influi no fenômeno observado. Os recursos tecnológicos existentes ainda são falhos e escassos para descobrir o mundo quântico, dando cada vez mais credibilidade ao Principio da Indeterminação proposto pelo alemão Werner Heisenberg, em 1927.
          A Teoria do Big Bang é uma das mais aceitas quando o assunto é a origem do Universo. Delineada pelos cálculos de Alexander Friedmann, foi defendida por George Lemaître que, por ser padre, foi olhado com certo desdém por cientistas como Einstein e Arthur Eddington, tornando-se famoso somente após virar notícia no The New York Times. O limite de Planck (10-43 de segundo) assinala o primeiro momento em que tempo e espaço coexistiram, após a Grande Explosão. Surgiram então as quatro forças fundamentais da natureza: 1ª) a forte, responsável pela ligação de prótons e nêutrons no interior dos núcleos dos átomos; 2ª) a fraca, responsável pela radioatividade; 3ª) a eletromagnética, responsável por reunir átomos em moléculas, estruturando a matéria; 4ª) a gravitacional, responsável pela atração universal de toda a matéria em si. A Teoria do Big Bang também explica o surgimento dos 109 elementos químicos conhecidos e, em sua maioria, classificados por Mendeleïev: 92 encontrados na natureza e 17 obtidos em laboratório. O autor apresenta um dado interessante em que, condensando toda a evolução do Universo em 1 ano, o calendário cósmico ficaria assim: 1º de janeiro: o Big Bang; 1º de maio: o despertar da Via Láctea; 9 de setembro: a irrupção do Sistema Solar; 14 de setembro: a formação da terra; 25 de setembro: o aparecimento da vida. No entanto, há um certo desafio em compreender os buracos negros, no qual uma estrela desaparece, contraindo de tal forma a sua massa, que a gravidade é capaz de sugar até mesmo a luz.
          Analisado o surgimento fantástico do Universo, falta ainda sua maior obra-prima: a vida. Pela Teoria da Panspermia, ela teria vindo do espaço. A matéria "cozida" por estrelas supernovas teria produzido aminoácidos e estes vindos para a Terra em meteoritos. Mesmo assim, acredita-se que a vida possa ter surgido mais de uma vez. Não se sabe como, mas se sabe que foi a partir de um aglomerado de moléculas. Nesse ponto, é pertinente o questionamento se a vida é algo deste mundo ou teria se desenvolvido também em outros planetas e galáxias, dando margem a seres extraterrestres. A complexidade de uma única cadeia de DNA do genoma humano é uma incógnita na evolução. Como a natureza se organizaria de forma tão lógica, reproduzindo cópias distintas, com reduzida margem de erro. Para o autor, até mesmo a materialização do Ser Divino na encarnação de Jesus Cristo, prova a possibilidade da união entre espírito e matéria, constatando que o ser humano é dotado da dignidade transcendental.
          Teorias à parte, a percepção da realidade objetiva depende sempre da realidade subjetiva do observador, de forma que Michel Talbot a descreve como sendo omnijetiva. Toda a lógica e beleza do Universo, levam o autor à conclusão de que ele foi arquitetado por uma mente inteligente, e não consequência de sucessivos eventos ocasionais, como uma obra de arte é o produto do talento de um artista.
 
BETTO, Frei. A Obra do Artista: uma visão holística do Universo. São Paulo: Ática, 1995. 2ª ed.. 262 pgs.

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