Uma das melhores obras do escritor
brasileiro Carlos Herculano Lopes, esse livro tornou-se merecedor do prêmio de
melhor romance da V Bienal Nestlé de Literatura Brasileira (1990). Também foi
encenado nas telas do cinema (1995), em um longa metragem dramático e
emocionante, rodado em 16mm e posteriormente editado para a televisão.
Uma palavra resume o clima da
narrativa desse livro: drama. Do início ao fim, o que temos é o relato pesado
de uma história triste de vingança, com uma aura de melancolia e pesar de
causar compaixão. Tudo acontece devido a um conflito entre latifundiários pela
posse de terras no município de Ingaí, em Minas Gerais, às margens do Rio
Tanguari. Fábio e Jaime eram dois amigos de infância que, repentinamente tem a
amizade cortada pela dureza de um assassinato, quando Fábio estava indo a
cavalo nas terras do pai do amigo – Joel – a fim de chegarem a um acordo sobre
a demarcação das terras. Contudo, Joel e o capanga Alcides armam uma emboscada
para Fábio incitando Jaime a atirar contra ele, sem permitir-lhe dar nem mesmo
a última palavra. Feita a execução, os
três fogem, sabe-se lá para onde.
A cena anterior é o ponto de partida
para todo o desdobramento da história, que é contada, ora pelo próprio
narrador, ora na voz dos próprios personagens. A descrição do corpo de Fábio,
seu velório, o pesar que caíra sobre seus familiares e o clima de desamparo e
angústia que fora instalado nos corações de sua mãe e seu pai é comovente. O
mesmo acontece com as reflexões tecidas a respeito da reação da mãe de Jaime,
os pensamentos de seu pai e o peso na consciência do próprio jovem. Como a
família de Jaime era rica, seu pai corrompe os investigadores e as testemunhas,
a fim de que forjem uma história que incrimine a vítima e inocente Jaime,
deixando para Arlindo a responsabilidade pela execução, por ter agido em
legítima defesa. Esse acontecimento destroi ainda mais as esperanças da família
de Fábio, principalmente sua mãe, Dona Helena, que caí em depressão profunda.
A riqueza maior da obra de Carlos Herculano,
talvez seja o mergulho na análise psicológica de cada componente do cenário
dramático. Joel, por exemplo, era dominado por forte ciúme de Jaime, que era
muito amado por sua mãe Ione. Com isso, o pai decide envolver o filho mais novo
no assassinato, visando também separá-lo de sua mãe. Por outro lado, abusos
sofridos durante sua infância, justificam a postura valente do pai frente aos
fatos, bem como a violência e frieza com que agia em tantos momentos de sua
vida. Jaime, torna-se o rapaz que perdeu a própria identidade ao ser coagido a
realizar uma tarefa que, por si, jamais teria feito. O fruto de tamanha
covardia é a sombra de Fábio a perseguir-lhe por toda a vida. Por outro lado,
Horácio, pai de Fábio, diante dos fatos fatídicos da execução e do suborno das
testemunhas, é lançado em culpa por ter levado a família para morar em um
ambiente tão hostil, restando-lhe como válvula de escape o alcoolismo. Helena,
mãe de Fábio, movida pela sede de vingança cria imagens de que o filho voltará
a qualquer momento, de forma que seus familiares decidem interná-la em um
manicômio, já que não sabiam lidar com tamanha loucura.
A densidade da narrativa de Carlos
Herculano é carregada e muito forte. O autor usa de uma linguagem coloquial
estilizada e muito eficaz em comunicar a crueza dos fatos frios que são
narrados. O tema da justiça é como que algo fruto de uma gestação interrompida
pelas quantias que são oferecidas às testemunhas para que atestem a inocência
dos verdadeiros culpados. A mescla entre narração em terceira pessoa, discurso
indireto livre e monólogo interior em uma multiplicidade de vozes, confere um
estilo diferencial e perfeitamente acoplado ao corpo do texto, de forma que o
leitor não se perde e sim se localiza melhor nos verdadeiros sentimentos de
cada personagem. O narrador dirige-se até mesmo ao próprio Fábio, na condição
de morto, em discursos solenes, como aqueles que são feitos para homenagear
grandes figuras. Entretanto, longe de exaltar a nobreza de caráter, a homenagem
aqui é negra e deprimente, beirando o arrependimento por seu último ato de
diplomacia desencadear tamanha dor e destruição para seus familiares.
REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título: Sombras de Julho
Autoria: Carlos Herculano Lopes
Editora: Atual
Ano: 1994
Local: São Paulo
Edição: 3ª
Gênero: Drama
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