“O coração tem suas
razões que a razão não conhece.
Sente-se isso em mil coisas.
É o coração que
sente Deus e não a razão.
Eis o que é a fé
perfeita: Deus sensível ao nosso coração”
(p. 144)
Inventor da calculadora, Blaise
Pascal se destacou na história principalmente como matemático, físico e
filósofo. Dentre suas obras, Pensamentos (Pensées, no original francês) ocupa um
lugar de destaque por conter as linhas mestras que orientavam o raciocínio
desse gênio. Além do mais, ela expressa de forma clara e desvelada a crença
irrefutável de Pascal nos preceitos da religião cristã. E é essa mesma religião
o escopo principal no qual o autor constrói e embasa seus argumentos em defesa
do cristianismo.
Para Pascal, a religião representa
uma dimensão crucial da existência do ser humano. Em virtude disso ele vai na
direção contrária aos libertinos, os
quais negam toda a religião revelada, devendo esta ser demonstrada para ser
passível de aceitação, e os céticos,
que colocam tudo em dúvida. A fim de garantir a importância da religião na vida
humana, Pascal parte de um preceito moralista: o homem é um ser miserável, um
nada do ponto de vista do infinito universo, um tudo do ponto de vista do nada,
de forma que ele é apenas um meio termo entre o nada e o tudo. No entanto, ele
é incapaz de atingir a verdade já que ela é constantemente enganada pela
imaginação e outras “potências enganadoras”. Daí surge o argumento da aposta de Pascal: resta ao homem apostar toda a sua
esperança na existência de Deus, pois tem tudo a ganhar e, mesmo que ele não
exista, nada teria a perder.
A existência humana conserva uma
grande ambiguidade: ela é o campo onde o ser humano pode experimentar
pobremente as promessas do paraíso, mas é também onde o homem constantemente se
deixa preencher pela vaidade. A busca por satisfação o faz perder-se em
prazeres fugazes perante o enorme potencial de ser que traz consigo. No
entanto, a dualidade deste ser é o ponto no qual se encontra a grandeza do
homem, que o faz reconhecer a sua miséria. Se a razão é importante para
conhecer e conciliar os dois extremos (tudo ou nada), por meio de algumas
verdades científicas, ela pode conhecer o meio. Nisto ela é ajudada pelo
coração, o qual lhe dá as intuições fundamentais sobre as quais ela constrói as
suas demonstrações. Não se trata de certezas inabaláveis e sim convicções mais
concretas e verdadeiras. Além do mais, a razão em si é insuficiente para
permitir a fé em Deus. Esta é alcançada somente se originar por um sentimento
do coração. Sendo assim, permitir a fé pela razão nada mais é do que conduzir o
homem a tomar consciência de sua contradição e da impotência das filosofias,
uma vez que elas afirmam e negam de tudo, e admitir que somente a religião pode
fornecer as respostas satisfatórias a todos os anseios. Consequentemente, ter
fé não consiste em compreender racionalmente todos os mistérios e por isso
manifestar a crença neles. Antes, a fé é uma atitude de humildade, de
impotência frente à complexa trama do existir, que faz com que o homem se curve
reverente perante o criador.
A obra Pensamentos não possui uma sequência didaticamente organizada.
Trata-se de reflexões que foram escritas por Pascal à medida que lhe surgiam no
espírito. Desta forma, os assuntos se entrelaçam sem uma sequência sistemática.
Mesmo assim, é possível captar facilmente no desenvolvimento da obra a estrita
defesa que Pascal faz da religião cristã, colocando-a como uma marca
orientadora para que o ser humano se encontre com sua própria verdade.
REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título: Pensamentos
Autoria: Blaise Pascal
Editora: Folha de São Paulo
Ano: 2010
Local: São Paulo
Edição: 1ª
Série: Coleção Folha: livro que mudaram o mundo - Vol. XV
Gênero: Filosofia
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