“De tudo, ficaram três
coisas:
a certeza de que ele estava sempre começando,
a certeza de que era preciso
continuar
e a certeza de que seria interrompido antes de terminar.
Fazer da interrupção um
caminho novo.
Fazer da queda um passo de dança,
do medo uma escada, do
sono uma ponte,
da procura um encontro” (p. 145)
A história contada em O Encontro Marcado toca diretamente no
desenvolvimento psíquico, afetivo e existencial do ser humano, visto da
potência criativa que fornece combustível para seus sonhos e confrontando com
as circunstâncias factuais de sua vida. Por isso, a narrativa acaba por revelar
o tênue véu que separa a vida idealizada, do cotidiano presentificado a cada
amanhecer.
Eduardo Marciano, filho do Senhor
Marciano e Dona Estefânia, é uma criança agitada pela vivacidade de suas
energias, na cidade de Belo Horizonte, numa época em que a cidade ainda moldava
sua importância como capital no contexto brasileiro. Como qualquer pessoa de
sua idade, Eduardo atravessa as rebeldias do desenvolvimento sexual.
Apaixonara-se por Lêda, uma garota que se destacava pela inteligência e suas
boas notas, e isso o fizera estudar mais e mais para impressioná-la. Tal
esforço desenvolveria em Eduardo o talento para a escrita, o que lhe renderia
um prêmio em um concurso de contos no Rio de Janeiro. Aliás, esse não seria o
único prêmio de sua vida, mas também uma medalha como campeão de natação.
Eduardo sempre cultivara a amizade e
uma perda o marcara profundamente. Foi quando seu amigo Jadir suicidou com um
tiro no peito, um dia após Eduardo ter conversado com ele sobre suicídio. No
entanto, a fruição do saber intelectual, principalmente pela leitura dos
grandes clássicos da literatura, aliada a uma atitude revolucionária em prol da
ideologia dos oprimidos em plena II Guerra Mundial, aproximaria ainda mais
Eduardo de seus amigos Mauro e Eugênio. Desta forma, os três marcam um encontro
para daqui a quinze anos, no mesmo local onde se formaram no colégio a fim de
confrontarem as experiências vividas nesse tempo.
As idas e vindas de Eduardo o
conduziram a um encontro inesperado com Antonieta, a filha de um importante
ministro, no Rio de Janeiro. Daí surgiria uma paixão que levaria ambos a
selarem sua união com o casamento. No entanto, passados os tempos de beleza e
encantamento, tal relação acaba por evidenciar o crescimento pessoal de
Antonieta e a estagnação comportamental de Eduardo, um sujeito sem referências
que lhe garantissem segurança e estabilidade emocional na vida. Além do mais,
um incidente ocorrido durante uma de suas idas ao Rio de Janeiro o abalaria
profundamente: uma mulher caíra da janela de um hotel minutos depois de Eduardo
dar entrada no mesmo e mudar de hospedagem logo após a tragédia. Eduardo
tornara-se o principal suspeito de um crime sem provas confiáveis nem motivos
explícitos. Seria mais um fardo para uma vida já sangrada por diversas perdas:
sua galinha Eduarda durante a infância, seu amigo Jadir, seu pai Marciano, seu
amigo de natação Rodrigo, seu filho ainda em formação no ventre de Antonieta.
A trajetória da vida de Eduardo
enfatiza de forma romanceada as inconstâncias de uma vida sem objetivos claros
nem referenciais seguros. É a tradução perfeita de alguém à procura de sentido
para sua existência, mas perdido no emaranhado de si mesmo. No entanto, o que
mais encanta na narrativa de O Encontro
Marcado é a viagem que o espírito humano é capaz de empreender na busca e
compreensão de si. Uma jornada de incertezas e repleta de descobertas
desafiadoras.
SABINO, Fernando. O
Encontro Marcado. Rio de Janeiro: Record, 1995. 63ª ed.. 288 pgs.
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