Nos tempos atuais, em que o avanço do capitalismo, o declínio dos valores tradicionais, o crescente consumismo e espírito de competitividade crescem sempre mais, uma pergunta se coloca aos cristãos, especialmente aos vocacionados à vida religiosa: como se inserir em tal contexto, vivendo a partir de uma adesão radical ao reino pregado por Jesus Cristo? A crescente massa de oprimidos, sem voz e nem vez, vem como o grito de um Deus que está sendo marginalizado, excluído, colocado à parte, mostrando-se na pessoa do outro: um Deus Oprimido. A partir dessa realidade questionadora, o padre Buelta busca, à luz de seus 18 anos de experiência, convivendo com os miseráveis de Guachupita na República Dominicana, tecer uma análise de conjuntura da pastoral da Igreja, buscando os sinais da coerência de seu discurso com sua prática na opção preferencial pelos pobres.
A pastoral entre os pobres parte do reconhecimento de que é o próprio Deus presente no mundo, que caminha com o povo na história, não como espectador, e sim como vítima dos mecanismos de morte. A partir daí, uma provocação aos religiosos: “Podemos nós entender o Evangelho, lendo-o desde nossa posição privilegiada no sistema, a partir do poder, da segurança, da instituição...?” (p. 19). A alternativa da inserção surge como um êxodo em direção aos oprimidos, na busca por encontrar o próprio Deus, que se encarnou entre os pobres, viveu como pobre e morreu pobre. Por isto, quer significar uma aceitação dos desafios contra a realidade de injustiça, dos dominadores e das ideologias. Inserir é também comungar da sabedoria, cultura e fé do povo, na busca de opções concretas que realizem o seu projeto na história. Trata-se de cultivar uma espiritualidade celebrativa, atenta às necessidades concretas, que produziriam a libertação da opressão. É ser sinal de contradição, frente ao curso da humanidade. Enfim, é um transcender de uma experiência meramente individual e narcísica de Deus, para uma experiência coletiva e libertadora, contemplando a Deus, na caminhada com seu povo. A realização concreta desse projeto leva à percepção de um reino de Deus que já está presente no mundo, pelas sementes de esperança que surgem, mas ainda não completamente, em virtude das injustiças e desigualdades entre as pessoas.
Contemplar a Deus na história é se comprometer com a vida. Nem uma práxis que se rotiniza no ativismo exacerbado, nem uma espiritualidade que se fecha sobre si mesma, sem inquietar-se diante de quem mais sofre. A inserção é a opção por viver como o povo, na busca de implodir em seu meio a mensagem de amor e fraternidade de Jesus, na luta pela justiça.
Destinado aos que fazem do compromisso com o oprimido o escopo da vivência radical e engajada da boa-nova do Evangelho, esta obra vem reacender essa opção fundamental. A urgência de uma pastoral coerente e eficaz é a demanda da Igreja, frente à realidade que se descortina sempre mais desafiadora. A vida religiosa é chamada a se desinstalar de seus confortos e se inserir entre os que são o alvo de seu discurso, rosto humano e oprimido de um Deus que caminha com seu povo, em Jesus Cristo.
REFERÊNCIA
LITERÁRIA
Título: Deus Oprimido, O
Subtítulo: em busca de uma espiritualidade da inserção
Autoria: Benjamin Gonzáles Buelta
Editora: CRB
Ano: 1989
Local: Rio de Janeiro
Gênero: Espiritualidade | Religião
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