O famoso autor de Hilda Furacão, falecido em 2002, consagrou
toda a sua carreira com esta sua última obra, Dia de São Nunca à Tarde. Trata-se de uma novela de leitura
facílima e rápida, mas construída em um contexto bastante interessante. Tal
novela é o único texto dado como acabado que integrava uma obra de contos não
terminada intitulada “Recordações do Paraíso”.
O espaço onde ocorre a trama é a
cidade mineira de Conceição do Mato Dentro, onde estava localizado o Colégio
São Francisco, durante um mês de agosto na década de 50. Este era um internato
curioso pelos padres que o dirigiam e pelos fantasmas que o habitavam, especialmente
os dos padres José Matusalém e Buta. O diretor geral era Frei Vicente de
Licodia, que havia adquirido a fama de santo na cidade, devido aos diversos
milagres que havia realizado. Frei Tanajura era um dos colaboradores do
internato, acumulando diversas funções, dentre elas a de supervisor e juiz de
futebol. Tinha pavor de ser enviado para morar entre os índios cintas-largas na
Amazônia e por isso, exercia suas funções com rigor e aplicação. Qualquer
desvio de conduta ou mesmo suspeita era registrado em um diário, a fim de que
tivesse pleno controle dos internos diante de Frei Vicente.
As atividades no colégio haviam
recomeçado e com elas o retorno dos alunos. Dentre esses, um era especialmente
esperado com maior ansiedade que os demais: Gabriel, que tinha uma irmã gêmea
chamada Gabriela, diferenciando-se desta apenas pelas roupas que vestia.
Gabriel era aguardado principalmente por fazer parte do time de futebol do
colégio, o “Estrela Solitária Futebol Clube”, e por compor o famoso “Trio
Maldito”, juntamente com Tomzé e Ruivo. Frei Vicente conservava certa rixa com
o time do Colégio Arnaldo de Belo Horizonte e via em Gabriel a esperança de
mais uma vitória no próximo torneio. Contudo, o retorno do jovem traria também
a grande incógnita que permeia toda a obra.
Gabriel voltara na limusine de sua
mãe em certa tarde e junto dele vinha Gabriela, encantando a todos por sua
formosura. Porém, havia muito, Gabriel trazia consigo a curiosidade em ser
mulher e Gabriela a curiosidade em ser homem. Desta forma, Gabriel decide ser
Gabriela, voltando com sua mãe para casa e Gabriela decide ser Gabriel,
permanecendo junto aos internos. Aparentemente nenhuma suspeita levantaram, mas
logo estas viriam, principalmente pela forma desajeitada com a bola, nos
treinos de futebol. Frei Tanajura logo desconfiaria que alguma troca houvesse
sido feita, mas temia revelar suas suspeitas a Frei Vicente, devido à cegueira
que este estava frente ao júbilo provocado pelo retorno de Gabriel. Além do
mais, suspeitas não são verdades e mais uma vez o que ficara é o enigma:
afinal, Gabriela se fazia de Gabriel?
Enriquecida por certo teor cômico
pelas características de seus personagens, Dia
de São Nunca à Tarde é a primeira obra em que o autor aborda de maneira
mais clara a questão da sexualidade, que era também uma de suas obsessões em
vida. E exatamente com essa obra, Roberto Drummond finalizou toda uma vida
literária que o consagrou como um dos grandes nomes da literatura brasileira.
DRUMMOND, Roberto. Dia de São Nunca à Tarde. São Paulo:
Geração Editorial, 2004. 88 pgs.
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