Trazendo sua experiência clínica
enquanto psicanalista, Irvin D. Yalom mais uma vez constroi uma trama
sobre os conceitos freudianos, desta vez envolvendo não só o próprio pai
da psicanálise, como também um dos maiores nomes da filosofia de todos
os tempos: Friendrich Nietzsche.
Josef Breuer é um médico psiquiatra famoso por seu olhar perspicaz em
descobrir a cura para seus pacientes. Desses, vale destacar o caso de
histeria de Bertha Pappenheim, psêudonomeada Anna O.. A partir das
consultas que teve com ela, Dr. Breuer formulou uma importante teoria,
segundo a qual, ao fazer com que o paciente retroceda até a fonte exata
de um sintoma, este desapareceria por si mesmo. Tal retrocesso se daria
por uma conversa em torno das reais causas do problema, cada vez mais
clareando as implicações desse no quadro clínico apresentado. Anna O.
atribuíra o termo de "limpeza de chaminé" a esse procedimento em suas
terapias, quando fazia suas colocações sem qualquer espécie de censura, à
respeito de suas aflições. Dr. Breuer partilhava suas experiências com
Sigmund Freud, seu amigo pessoal e aluno. Além disso, dividia o tempo
entre o trabalho e a família, representada pela esposa Mathilde e seus
filhos.
Em
um dos dias da rotina de seus atendimentos, Dr. Breuer recebe a visita
de uma mulher chamada Lou Salomé, que lhe dissera ter um amigo que muito
precisava de sua ajuda médica, mas que era por demais orgulhoso para
pedi-la. Movido mais pelos encantos de Salomé do que pelo interesse em
ajudar, Dr. Breuer decide ir ao encontro do referido homem. Tratava-se
do professor Friendrich Nietzsche: uma pessoa de personalidade rígida,
convicta de suas opiniões e fechada sobre si mesma. Os primeiros
encontros deram a Breuer a dimensão do desafio que aceitara. No entanto,
desejoso de não perder o paciente após uma séria discussão, Dr. Breuer
decide inverter os papeis para tratar o caso de Nietzsche: revelaria a
ele aspectos afetivos de seu envolvimento com a paciente Anna O., bem
como sua relação conturbada com a esposa por causa disso, na tentativa
de que Nietzsche se abrisse à partilha, quando cada um deveria voltar a
seus devidos lugares. Desta forma, Nietzsche aceita se internar no
quarto 13 da Clínica Lauzon, em Viena, para tratar o caso de Breuer.
Este, por sua vez, partilharia as experiências vividas com seu paciente
com Sigmund Freud, empregando o codinome Herr Eckart Müller para
se referir ao professor. Restava a Breuer mensura o momento certo em que
quebraria o pacto e voltaria a ser o médico de Nietzsche. Mas o grau de
envolvimento que teria ao falar de si e a perspicácia do professor
colocariam Breuer numa situação que dificilmente poderia ser revertida.
Embora empregando nomes de personagens e fatos verídicos, a trama
narrada por Yalom é essencialmente fictícia. Mesmo assim, o leitor
poderá se beneficiar de um conhecimento mais amplo, já que o autor faz
alusão a conceitos ou teorias psicanalíticas e filosóficas como a
regressão, a livre associação de ideias, a projeção, o niilismo, a
religião como uma alienação, o cristianismo como um fardo pesado para os
fieis. Interessante destacar também a riqueza literária da obra em
seguir um tendência encontrada em outras obras do autor, como o
atendimento clínico transformado em literatura. Os traços de cada
personagem permitem uma coerência na construção da trama. Coerência essa
que é rompida quando é revelada a fase de crise dos mesmos. Tal
revelação é surpreendente principalmente no choro de Nietzsche, quando
este parece ser a figura mais firme e coesa do romance como um todo.
YALOM, Irvin D. Quando Nietzsche chorou. Rio de Janeiro: Ediouro, 2005. 20ª ed.. 410 pgs.
Confira a adaptação para o cinema lançada em 2007:
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